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Maioridade Penal

Dando continuidade a minha vontade de amarrar pontas dialéticas deixadas em 2012, volto a um tema proposto pelo +Júlio Cesar de Melhado e Lima  em seu post em 6 de Novembro de 2012 no Facebook.

O post é tão bom que vou transcreve-lo aqui:
Para você que pensa que a maioridade penal deva ser reduzida, dos atuais 18 anos, para 16a, 14a, ou menos. No que você se baseia? 

Eu sou contra, e baseio minha opinião em um raciocinio simples de entender.
Até o início da terceira década de vida, por volta dos 20 e poucos anos, o ser humano ainda não possui o seu cortex frontal totalmente desenvolvido. 

E é este cortex pré-frontal, segundo a neurociência, o responsável por nossas funções cognitivas mais complexas, como personalidade, pelo raciocinio, pela avaliação de fatos, consequências, pelo controle de impulsos, etc. 
Ou seja, sem o cortex pré-frontal totalmente desenvolvido, a criança e o adolescente não é capaz de executar plenamente estas funções.

Ora, assim como um deficiente mental não pode ser imputado responsabilidade penal, por ser incapaz, o menor de 20 e poucos anos também não é capaz de avaliar corretamente as consequências do seus atos, ou ainda, pode não ser capaz de controlar os impulsos, medir as consequências adequadamente, etc.

Assim, cientificamente, não faz sentido punir-lo.

E você, em que baseia a sua opinião?
 Penso que algumas "hipérboles" usadas no final da construção argumentativa prejudicam um pouco a ideia geral. O primeiro pecado é dizer que não deve haver punição para pessoas menos capazes. O pai, passando um sermão, estipulando um castigo é uma punição que sim, deve ser aplicada ao menor na maioria dos casos para inclusive seu melhor "desenvolvimento". Mas, no parágrafo anterior o "erro" é mais sutil.

O menor de 20 e poucos anos também não é capaz de avaliar corretamente as consequências do seus atos, ou ainda, pode não ser capaz de controlar os impulsos, medir as consequências adequadamente, etc.

(Sejamos minimamente lenientes e interpretemos o segmento "o menor de vinte e poucos não é capaz de", como dizendo que "não é possível afirmar que todos os menores de vinte e poucos anos serão capazes de")

O fato do cortex pré-frontal não estar plenamente desenvolvimento não IMPLICA que o menor não tenha as faculdades necessárias para avaliar consequência de atos ou para controlar seus impulsos.  Pode, não fazer isso em sua plenitude (embora, a proposição colocada no terceiro parágrafo não não tenha colocado dessa maneira) mas quanto dessa capacidade seria necessário para compreender quão terrível é matar? O que se espera de um jovem de dezoito anos? E o de catorze?

Os juristas lançam a questão da capacidade do indivíduo na questão da imputabilidade:
 “Imputável é o sujeito mentalmente são e desenvolvido que possui capacidade de saber que sua conduta contraria os mandamentos da ordem jurídica.” (JESUS, Damásio E. de. Direito Penal. Parte Geral. São Paulo: Saraiva, v. 1.)"
Por essa leitura, minha filha de onze anos poderia ser imputável. A mais, por que deveríamos esperar um psicopata,  com alguma anormalia irreversível no cortéx pré-frontal, chegar a maioridade para que seja imputável. Pelo raciocínio do Julio, esse indivíduo nunca seria imputável quando na verdade a sociedade deveria se proteger desse indivíduo o quanto antes.

O que nos remete ao começo da discussão.

Na verdade, embora tenha passado rapidamente pela questão do castigo, penso como sendo esse o  ponto principal da discussão. O código penal ao impor a um indivíduo sua reclusão não está o punindo como forma de vingança. A intenção do código é  fundamentalmente a manutenção da sociedade. Para isso, a justiça tenta coibir ações danosas, afastar a sociedade do perigo de pessoas desajustadas ao seu convívio e ajudar no "recuperação" de pessoas  (claro, quando isso é possível). A punição, como foi dito, pode colaborar como o desenvolvimento do indivíduo:
Uma pessoa que não tem medo diante de ameaças e que não sente indignação está mais vulnerável ao comportamento corrupto.[1]
Por todos essas questões, eu concordando com o Julio acredito que, a efetivade e o rigor das punições devam ser discutida de forma separada a maioridade penal. Enquanto em uma discussão quer-se saber qual a forma mais apropriada para tratar o agente que comete ato punível, na outra quer-se saber em que momento o indivíduo desenvolveu seu ponto máximo para compreender sua conduta. Há de se convir que não é necessário chegar ao máximo, para o agente tenha responsabilidades sobre seus atos.

Editado: Ao que parece, o desejo pelo redução da maioridade penal é na verdade o desejo pela adequação do código para que punições mais efetivas (algumas vezes mais severas) sejam aplicadas aos menores de dezoito anos. É uma distorção, uma injustiça e um erro não punir de forma adequada esses indivíduos mas é também uma distorção qualificar o menor como se tivesse as mesmas capacidades e responsabilidades do adulto.

Editado2: Peço desculpas ao Julio porque tive (muito) mais tempo para escrever e editar esse texto do que ele teve para fazer seu post, que foi mais uma reação as correntes que pedem de forma quase injustificada a redução da maioridade penal.

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